Pr. André Decotelli

crianc%cc%a7aAo lermos o texto bíblico acima somos levados a uma constatação clara e evidente: o critério para entrar no Reino é fazer-se como uma criança. Ao longo dos últimos anos como pastor de criança, tenho tido a oportunidade de conhecer mais de perto o universo delas e com isso tenho aprendido “in loco” como ser uma criança. Gostaria, então, de lhe sugerir alguns caminhos sobre o ser criança. Talvez você, como eu, já tenha esquecido da criança que foi um dia, e, portanto, é preciso tirarmos a poeira das lembranças e fazermos reviver o menino e a menina que fomos. Em cada edição e texto desta coluna aprenderemos sobre um aspecto da criança que devemos seguir.

A primeira questão que quero destacar é que para sermos como crianças é preciso tê-las por perto. Como poderemos nos assemelhar a algo de que desconhecemos? Para que a cópia seja fiel ao original é necessário que o olhar seja atento, presente e intenso. Nesse sentido, precisamos ser amigos das crianças, conversar com elas, investir tempo ao seu lado, botar o papo em dia. Eu costumo dizer que meço o valor das pessoas pelo quanto são queridas pelas crianças e vice-versa, ou seja, para mim, gente boa é gente amiga das crianças. Digo isso pois ser amigo de criança é não querer algo em troca. Num mundo em que as amizades muitas vezes se pautam por interesses, segundas intenções, e “do que eu vou ganhar com isso”, precisamos aprender com as crianças sobre o que é amizade. Quem se entrega a uma amizade com uma criança não deseja nada além da própria relação, do contato com outro ser que lhe é diferente, mas tão importante quanto. Ser um amigo de crianças é experimentar a riqueza e a profundidade do significado da palavra amizade.

E crianças sabem ser amigas. Elas sabem o que é importante na vida e não perdem tempo com besteiras e orgulhos bestas. Criança sabe que o tempo aqui é curto e que precisamos aproveitar cada segundo como se fosse o último. Gosto de observá-las em festas, de vê-las correndo e brincando intensamente. Isso não é aquilo que chamamos de felicidade? E gosto de perceber quando elas fazem novas amizades em uma festa. Geralmente chegam acanhadas, meio tímidas, mas em questão de minutos já estão correndo e interagindo com a outra criança como se a conhecesse há anos. E o naqueles instante o tempo para, não há fome ou cansaço. É tempo de celebrar a amizade e o encontro somente. E na hora de ir embora é aquela tristeza. A amizade ali teve início, meio e fim. Mas foi verdadeira, sincera e divertida.

Qual foi a última vez que você sentou com uma criança para “trocar uma ideia”? Pergunte a ela sobre política, futebol, rotina, sobre o que gostam de fazer nas horas vagas. Em geral, consideramos o que dizem as crianças como sendo de menor importância, como se fosse um conhecimento inferior, de menor “ciência”. Mas te sugiro perceber mais detalhadamente o que elas dizem. A cada dia sou surpreendido com suas falas e sugestões, e experimento nesses momentos um assombro, e, espantado, me questiono: deste tamaninho, de onde vem tanta sabedoria?

Há um universo a ser conhecido no mundo das crianças. E Jesus bem sabia disso, quando ordenou aos seus discípulos que não só deixassem que as crianças fossem até ele, mas que também seriam elas o modelo de comportamento do seu Reino. “Que coisa estranha de se ouvir! Jesus deve estar falando em metáforas, é licença poética”, talvez devam ter pensado os discípulos, que não devem ter levado a sério as palavras de Jesus. A tradição cristã e a história demonstram que isso, infelizmente, ocorreu. Dentre todos os critérios para se entrar no Reino de Deus, ser como uma criança parece ter sido esquecido e renegado.

Eu creio que o Reino de Jesus é um Reino das crianças. Um lugar onde podemos brincar, sorrir, correr, nos amarmos, sem hora de irmos embora, apenas com o tempo de sermos crianças novamente, todos os dias, como em uma festa.

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