Pr. João Soares da Fonseca
O trânsito carioca se arrastava naquela triste manhã de 1988. Na ponte sobre o rio Faria Timbó, em Higienópolis, vi um corpo inchado que, boiando, descia o rio. Ninguém sabia de onde estava vindo, quem o jogou ali, por que jogou. Aquele corpo estava indo embora, mas me deixava perguntas.
A primeira ― Onde estará passando a eternidade o espírito daquele corpo? Habitará agora na presença de Deus? Vida eterna ou morte eterna? Qual terá sido a opção que fez?
Enquanto perguntava, o corpo ia descendo…
A segunda ― Foi crime? Quem cometeu? Uma esposa traída? Vingança? Queima de arquivo? Desavença profissional? Será que não foi morto por engano? Foi um ato heroico da polícia que combatia a criminalidade? Reagiu a assalto?
Em algum lugar do mundo, alguém tem agora as mãos manchadas de sangue. Por que será que um homem mata o outro? Será que é só porque tinha uma arma na mão?
Enquanto perguntava, o corpo ia descendo…
A terceira ― Quem ficou chorando? Uma noiva que viu fugir o sonho do altar? Alguém viu uma senhora por aí, mãe de família, chorando o seu filho? Enviuvou alguém? Se era pai, deixou órfãos lamentando a sorte neste mundo, onde viver já é difícil mesmo com pai vivo? Deixou pensão? Papéis em dia?
E o corpo ia descendo…
A quarta ― Alguém evangelizou o dono vivo daquele corpo morto que eu vi boiando no Faria Timbó? Será que alguém o convidou a vir a Cristo ou à igreja? Foi posto antes um folheto, um Novo Testamento, uma Bíblia, em suas mãos?
E lá se vai o corpo…
A última ― Como é que é? Vai ficar tudo por isso mesmo? Será que tudo que as pessoas vão fazer é apenas menear a cabeça? Será que o mundo não tem mais jeito? Será que ainda sobrou alguma sensibilidade no coração das pessoas?
Perdi o corpo de vista…
Até quando, Senhor, teremos corpos sem dono descendo o rio da vida e da dignidade?
Até quando teremos que conviver com tantas interrogações?